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Indenização por desapropriação tem novidades legislativas e jurisprudenciais

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Dois são os motivos que me levam a escrever sobre este tema. O primeiro é a edição da Medida Provisória 700, de 8 de dezembro de 2015, recentemente comentada pela professora Maria Sylvia Di Pietro neste espaço – e que alterou regras do Decreto Lei 3.365/1941, do Código Civil e da Lei de Registros Públicos; a segunda é o reconhecimento pelo Supremo Tribunal Federal (STF) da Repercussão Geral no RE 922.144, sob relatoria do ministro Luis Roberto Barroso, que discute a compatibilidade da indenização prévia (artigo 5º, XXIV, da Constituição) com o regime executivo dos precatórios (artigo 100, da Constituição). O processo está ainda pendente de apreciação pelo Plenário do STF.
Em benefício da brevidade, convém fazer um primeiro recorte para tratar exclusivamente do aspecto atinente à indenização expropriatória. Outro recorte para fixar luzes sobre a desapropriação ordinária, cujo pagamento da indenização é realizado em pecúnia.
É certo que a Constituição literalmente prescreve (artigo 5º, XXIV) que a indenização expropriatória deve ser prévia, justa e em dinheiro, ressalvados os casos nela previstos. Além disso, o artigo 16, §4º, II da Lei de Responsabilidade Fiscal exige que para fins de desapropriação de imóveis urbanos (para mim o dispositivo se aplica a toda e qualquer desapropriação ordinária), o ato de desapropriação seja precedido de a) estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subsequentes; b) declaração do ordenador da despesa de que o aumento tem adequação orçamentária e financeira com a lei orçamentária anual e compatibilidade com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orçamentárias. 
Há mais de 50 anos, Manoel de Oliveira Franco Sobrinho propunha a substituição do termo indenização pela noção conceitual de compensação indenizatória, a englobar a) o justo preço pela perda em si da propriedade e tudo o mais que nela se integra, b) além da reparação proporcional dos danos e prejuízos produzidos em desfavor do expropriado pela execução do conteúdo do ato expropriatório.[1]
Divisam-se — na perspectiva trabalhada pelo professor paranaense — as expressões ‘equivalência econômica’ e ‘reparação econômica’. A primeira referente à perda da propriedade física (e seu estado no momento da desapropriação); a segunda relativa aos danos e prejuízos (imediatos e futuros), experimentados pelo particular como consequência da perda da propriedade.
Com efeito, tratando-se de compensação econômica, "conquanto se argumente com a idéia de justiça, o que se preconiza é a indenização igual ao desfalque patrimonial, sem outra consideração que não a rigorosa equivalência entre o que se dá e o que se recebe. Forçoso, assim, é reconhecer que, em vez de exigir uma indenização justa deveria a Constituição ordenar que ela seja integral, de valor idêntico à redução patrimonial. O que se tem preconizado é que a indenização expropriatória seja completa.”[2]
Esta orientação tem encontrado relativo eco na jurisprudência do STJ, que registra precedente no sentido de que "considera-se justa a indenização cuja importância habilita o expropriado a adquirir outro bem equivalente ao que perdeu para o poder público, ou seja, equivalente ao valor que o expropriado obteria se o imóvel estivesse à venda.”[3]
É interessante a conexão que faz o STJ entre a justeza da indenização e a potencialidade de aquisição de um novo bem pelo expropriado. É que ela revela a imprescindibilidade, ao lado da equivalência e da reparação econômicas, da oportunidade econômica da indenização, como que inerente ao conceito de indenização completa ou justa.
Afinal de contas, em que momento deve ser paga a indenização expropriatória para que seja justa? Ela deve ser prévia à declaração expropriatória? À posse (no caso de imissão provisória)? À transcrição do bem (quando for o caso)? À decisão de mérito do processo judicial respectivo? Ao trânsito em julgado da sentença condenatória?[4]
Tratando-se de ‘desapropriação amigável’ ou administrativa, desde que convencionado pelas partes, admite-se que a indenização venha a ocorrer em momento posterior ao acordo entre as partes, dando-se o pagamento à vista ou em parcelas, conforme acordado, em razão da natureza disponível do direito do particular. Por outro lado, tratando-se de desapropriação judicial, a corrente majoritária tem entendido que a indenização deve anteceder à respectiva consumação, a qual, a seu turno, pressupõe o pagamento do valor correspondente: "o Poder Público só adquirirá o bem e o particular o perderá com o pagamento da indenização”.[5]
Do ponto de vista prático — e dos efeitos sobre o patrimônio do particular, todavia, a imissão provisória na posse e a destinação do bem à finalidade pública alegada no ato expropriatório, garantem ao Poder Público o exercício de todos os atributos típicos do domínio e impossibilitam o reaver do bem, por força do artigo 35 do Decreto Lei 3.365/41.
Esta posição é corroborada pela recentemente editada Medida Provisória 700, de 8 de dezembro de 2015, cujos artigos 2º e 3º, ao alteraram o artigo 176-B da Lei 6.015/73 (Lei de Registros Públicos) e os artigos 1.225, XIII e 1.473, XI do Código Civil, atribuíram efeitos jurídicos de direito real aos direitos oriundos da imissão provisória na posse dos bens expropriados, quando concedida à União, Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, ou às suas entidades delegadas e respectiva promessa de cessão.
A alteração legislativa é relevante e implica revistar criticamente o conceito de previalidade de indenização, na perspectiva da oportunidade econômica anteriormente descrita, até porque na jurisprudência do STF há precedentes no sentido de que: "subsiste no regime da CF de 1988 (artigo 5º, XXIV), a jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal sob a égide das Cartas anteriores, ao assentar que só a perda da propriedade, no final da ação de desapropriação — e não a imissão provisória na posse do imóvel — está compreendida na garantia da justa e prévia indenização.”[6]
Com efeito, para a vetusta orientação do STF somente após o fim das discussões judiciais sobre o justo valor da indenização é que o particular será indenizado pelo valor completo, recebendo o montante constante da condenação judicial, pela via crucis do sistema de precatórios (artigo 100, CR/88). Esta indenização, sobre ser garantida somente ao fim do processo judicial, pelo método tradicional de execução de obrigação de dar contra a Fazenda Pública, como a devida vênia, nunca será justa e precisa ser urgentemente revisitada pelo STF no julgamento da repercussão geral no RE 922.144.
Para que se atenda à efetividade do direito fundamental de propriedade, conciliando-o com a prerrogativa de requisição da imissão provisória no curso da ação de desapropriação e, ainda, com o sistema de privilégios processuais do Estado, deve-se compreender que o Poder Público, se condenado em juízo pela insuficiência do valor indenizatório da desapropriação, é obrigado a fazer a complementação dos depósitos judiciais iniciais (realizados para efeito de imissão na posse), conforme determinado pela sentença de primeiro grau ou pelo acórdão de segundo grau (em caso de reforma).
Isto porque essa complementação de valores (faltantes da indenização expropriatória determinada pelo Poder Judiciário) há de ser compreendida como condenação a uma obrigação de fazer (porquanto existe na Constituição um dever estatal de avaliação adequada e reparação prévia e completa do patrimônio do expropriado) e não a uma obrigação de dar, excluindo, como conseqüência, o expropriado de receber a compensação apenas ao final da ação e pela via dos precatórios (artigo 100, CR/88).
Esta proposta tem a potencialidade de garantir justeza e contemporaneidade à indenização expropriatória (equivalência + reparação + oportunidade), para além de atender ao princípio constitucional da duração razoável do processo (artigo 5º, LXXVIII, CB/88).

[1] FRANCO SOBRINHO, Manoel de Oliveira. Desapropriação. 2. ed., São Paulo: Saraiva, 1977. p. 116.
[2] MENDES, Vicente de Paula. A Indenização na Desapropriação. Belo Horizonte: Del Rey, 1992. p. 53.
[3] STJ – REsp 608.324/RN, Rel. Ministro FRANCISCO PEÇANHA MARTINS, Rel. p/ Acórdão Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA TURMA, julgado em 12/06/2007, DJ 03/08/2007, p. 325.
[4] GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 15. ed., São Paulo: Saraiva, 2010. p. 897. 
[5] URBANO CARVALHO, Raquel Mello. Direito Administrativo. 2. ed., Juspodium: Salvador, 2009. p. 1156.
[6] STF, RE 195.586, Rel. Min. Octavio Gallotti, julgamento em 12-3-1996, Primeira Turma, DJ de 26-4-1996. No mesmo sentido: RE 141.795, Rel. Min. Ilmar Galvão, julgamento em 4-8-1995, Primeira Turma, DJ de 29-9-1995.


Autor: Luciano Ferraz é advogado e professor associado de Direito Administrativo na UFMG.
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 3 de março de 2016, 10h36

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