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Geral - Penhora de bem gravado por alienação fiduciária. Pode?

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Em que pese o aumento desordenado e sucessivo das taxas de juros oferecidas por instituições financeiras para a concessão de crédito, cada vez mais pessoas têm se valido de tais modalidades para a aquisição de bens de alto valor, sobretudo na compra de veículos e imóveis, tendo em vista encontrar nos financiamentos o único meio acessível para a realização de seus objetivos pessoais e profissionais.

De maneira inteligível, ao financiar a aquisição de um bem, as instituições utilizam-se da alienação fiduciária em garantia como forma de salvaguardar o adimplemento da obrigação, em detrimento dos tradicionais direitos reais de garantia (penhor e hipoteca).

Fora ao tratamento geral dado pelo Código Civil em seus arts. 1.361 a 1.368-B, há leis esparsas que tratam especificamente sobre o tema, destacando o Decreto-lei 911/69, que cuida da alienação fiduciária em garantia sobre bens móveis, e a Lei nº 9.514/97, que aborda o instituto em relação a bens imó­veis, aplicando, em ambos os casos, a legislação privada supletiva e subsidiariamente.

Para a conceituação do instituto, utilizaremos o art. 22 da Lei nº 9.514/97, ipsis litteris:

Art. 22. A alienação fiduciária regulada por esta Lei é o negócio jurídico pelo qual o devedor, ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa imóvel.

Nota-se, assim, que a alienação fiduciária em garantia é o negócio jurídico pelo qual o devedor, para garantir o pagamento da dívida, transmite ao credor a propriedade fiduciária de um bem, conservando a posse indireta, sob a condição resolutiva de adimplemento.

Isto posto, realizada a alienação fiduciária, o bem dado em garantia não mais integra o acervo patrimonial do devedor fiduciante, ao menos até o advento do pagamento ou quitação, momento em que devedor volta a ter a propriedade plena do bem, conforme disposto no art. 25, § 2º da Lei nº 9.514, in verbis:

Art. 25. Com o pagamento da dívida e seus encargos, resolve-se, nos termos deste artigo, a propriedade fiduciária do imóvel.

[...]

§ 2º À vista do termo de quitação de que trata o parágrafo anterior, o oficial do competente Registro de Imóveis efetuará o cancelamento do registro da propriedade fiduciária.

Feitas tais considerações, interessa-nos no presente artigo a análise acerca da possibilidade de constrição judicial de bem gravado por alienação fiduciária, em razão de dívida contraída pelo devedor fiduciante totalmente alheia ao negócio jurídico que originou o gravame.

Inicialmente, devemos considerar a penhora como ato executivo de individualização do bem, com o fim de sujeita-lo à execução.

Tal individualização denota um dos efeitos processuais da penhora, consistente na separação do bem que servirá para a satisfação do crédito do exequente, daqueles pertencentes ao patrimônio do executado. Livram-se, assim, os demais bens das limitações decorrentes da medida constritiva, possibilitando, por conseguinte, o usual exercício dos poderes inerentes à propriedade (uso, fruição e disposição – Art. 1.228 do Código Civil).

Consoante demonstrado, em caso de bem gravado por alienação fiduciária, o devedor fiduciante não detém a propriedade plena do bem, mas apenas a posse direta, enquanto pertence ao credor fiduciário a propriedade resolúvel.

Quitada a dívida, tem-se o implemento da condição resolutiva, ao passo que o devedor fiduciante retorna ao status quo ante da realização do gravame. Ao revés, em caso de inadimplemento da obrigação, a posse direta pode ser retomada pelo credor fiduciário.

Este, portanto, consiste no principal argumento de oposição à possibilidade de constrição de bem gravado, já que o credor fiduciário não é obrigado a responder com bens de sua propriedade, ainda que resolúvel, por dívidas alheias.

Reiterando o entendimento sedimentado na jurisprudência pátria, a 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por ocasião do julgamento do Agravo Regimental nº 0017118-33.2014.4.01.0000, assentou que:

TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. PENHORA DE BENS GARANTIDOS POR ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. IMPOSSIBILIDADE. CABÍVEL, NO ENTANTO, A PENHORA SOBRE OS DIREITOS DO DEVEDOR FIDUCIÁRIO, COM PRÉVIA ANUÊNCIA DA INSTITUIÇÃO FINACEIRA. PRECEDENTES DESTE TRIBUNAL E DO STJ. PENHORA DE VALORES PROVENIENTES DE OPERAÇÕES COM CARTÃO DE CRÉDITO. INEFICÁCIA DA MEDIDA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.

1. Não é cabível a penhora sobre bens garantidos por alienação fiduciária, pois estão fora da esfera patrimonial do devedor. Precedentes do STJ.

2. Contudo, é possível que a constrição recaia sobre os direitos do devedor fiduciário, decorrentes do contrato entabulado com a instituição financeira, mediante anuência prévia do credor fiduciário. Precedentes do TRF 1ª Região e do STJ.

3. A penhora de eventuais valores provenientes de operações com cartões de crédito mostra-se ineficaz, haja vista que a sociedade executada encontra-se desativada desde fevereiro de 2009. 4. Agravo regimental não provido.

A despeito do entendimento, também restou consolidada a possibilidade de a constrição recair exclusivamente sobre os direitos do devedor fiduciante, conforme já vinha decidindo o Superior Tribunal de Justiça, in verbis:

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. CONTRATO DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. DIREITOS DO DEVEDOR FIDUCIANTE. PENHORA. POSSIBILIDADE.

1. Não é viável a penhora sobre bens garantidos por alienação fiduciária, já que não pertencem ao devedor-executado, que é apenas possuidor, com responsabilidade de depositário, mas à instituição financeira que realizou a operação de financiamento. Entretanto é possível recair a constrição executiva sobre os direitos detidos pelo executado no respectivo contrato. Precedentes.

2. O devedor fiduciante possui expectativa do direito à futura reversão do bem alienado, em caso de pagamento da totalidade da dívida, ou à parte do valor já quitado, em caso de mora e excussão por parte do credor, que é passível de penhora, nos termos do art. 11, VIII, da Lei das Execuções Fiscais (Lei nº 6.830/80), que permite a constrição de ‘direitos e ações’. (REsp 795.635/PB, de minha relatoria, DJU de 07/08/2006).

3. Recurso especial provido. (STJ. 2ª Turma. REsp 910.207/MG, Rel. Ministro Castro Meira. Publicado no DJ 25/10/2007)

Por conseguinte, em caso de propositura de processo executivo, e na remota hipótese de inexistência de outros bens passíveis de penhora, poderá o credor satisfazer seu crédito através da constrição dos direitos da parte executada à futura aquisição da propriedade do bem gravado com alienação fiduciária, após pagamento da totalidade da dívida do contrato.

A justificativa encontrada no Código de Processo Civil de 1973 para a realização da penhora dos direitos do devedor fiduciante, era a autorização constante no art. 655, inciso X, que determinava:

Art. 655. Incumbe ao devedor, ao fazer a nomeação de bens, observar a seguinte ordem:

[...]

X - direitos e ações.

Com o advento do Novo Código de Processo Civil, o legislador entendeu por bem estabilizar o posicionamento, fazendo constar no artigo correspondente ao 655 revogado, relativo ao rol dos bens penhoráveis, o seguinte termo:

Art. 835. A penhora observará, preferencialmente, a seguinte ordem:

[...]

XII - direitos aquisitivos derivados de promessa de compra e venda e de alienação fiduciária em garantia;

Neste sentido, em que pese a existência de posicionamentos isolados, é inconteste a impossibilidade de penhora de bem gravado com alienação fiduciária.

Não obstante, na vertente do entendimento jurisprudencial, e devidamente sedimentado com o advento do Novo Diploma Processual, eventual medida constritiva deve recair apenas sobre os direitos do devedor fiduciante em relação à coisa, dentre os quais o de reaver a propriedade com o implemento da condição resolutiva e o de receber o saldo apurado na venda de bem precedida pelo fiduciário para a satisfação do seu crédito, em caso de inadimplemento.

Fonte Jusbrasil

ImprimirReportar erroTags:devedor, fiduciária, penhora, alienação, direitos, propriedade e bens1202 palavras13 min. para ler

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